SOBRE CAFÉ, OVOS E PEIXES. POR QUE VIAJAR.

SOBRE CAFÉ, OVOS E PEIXES. POR QUE VIAJAR.

Para os americanos são ovos. Chineses, peixes.

A memória que me vem à cabeça ao pensar em café da manhã é o café fresquinho da minha mãe sendo passado de manhã cedo, seu cheiro invadindo e aquecendo toda a casa com uma sensação de conforto quase palpável. Dá vontade de acordar devagarinho e esperar a manhã passar lentamente pela janela. Talvez por isso que eu nunca tenha conseguido tomar café da manhã em dias úteis. Acordando atrasada, não quero arruinar o prazer do café bem desfrutado, antecipando trânsito, chuva, pressa ou reunião.

Essa associação acontece porque quando aprendemos uma palavra nova, ancoramos experiências a ela. Então ao ouvirmos posteriormente a mesma palavra, tiramos da prateleira memórias daquela experiência como ferramentas em uma caixa e utilizamos essas ferramentas para nos comunicar.

É por conta disso que nos comunicar com pessoas que viveram em outras culturas traz sempre algumas dificuldades. Além da lógica barreira da língua, podem haver também âncoras diferentes para a mesma palavra entre pessoas de etnias diferentes. Por exemplo, ao falar de café da manhã, posso me lembrar do cheirinho do café da minha mãe, enquanto a chinesa ao meu lado está pensando em peixes e o americano à minha frente salivando por ovos.

Americanos associam café da manhã a ovos de uma maneira tão forte, que ao morar nos Estados Unidos eu ouvia muito a expressão “comerei hoje “café-da-manhã-para-o-jantar” e tinha uma grande dificuldade de compreender do que se tratava. Para mim, uma vez que café da manhã e jantar são refeições definidas pelo momento em que as temos, não importa o prato que se peça. Para os americanos qualquer prato com ovos se converte imediatamente em café da manhã, não importa qual o momento do seu consumo.

Quando viajei para a China, eu acordava todas as manhãs no hotel e me dirigia ao restaurante já com a barriga roncando. Era hora do jantar no meu relógio biológico e eu não havia comido nada o “dia todo”. Como era a primeira refeição do dia eu esperava pães, queijos, leite, café e geleias. Mas, ao entrar no restaurante a cada dia, meus sentidos eram invadidos por um cheiro forte de peixe seco. Imagine por um momento o cheiro da peixaria do bairro próximo à sua casa: agora intensifique. Essa é a ideia. Antes de meu estômago se revoltar, resolvi entender.

O café da manha Chinês típico é feito de produtos locais, amplamente disponíveis. E como a moça do hotel fez a gentileza de me explicar, em um povo de 1,4 bilhões de pessoas, eles aproveitam tudo e não desperdiçam nada. Faz sentido.

O prato do café da manhã servido ali era uma espécie de mingau de arroz, feito quando se cozinha o arroz até quase desmanchar e virar uma papa consistente. Apesar de algumas pessoas comerem só, a maioria adiciona peixe seco, bolas pequenas de frango ou porco, amendoim, picles, gengibre e fatias de ovos de patas em conserva.

Ovos, torradas e queijo são raramente vistos, a não ser que sejam feitos especialmente para você. E, se for esse o caso, são muito caros.

Assim, se você estiver falando de café da manhã com um chinês ou um americano, pode apostar que eles estão pensando em coisas muito diferentes de você naquele minuto.

Essa é uma das razões pelas quais eu gosto tanto de viajar. Nós, como brasileiros, temos dificuldade de entender a nossa cultura assim como, segundo um ditado espanhol, os peixes não compreendem a água que os rodeiam.

Fomos criados dessa forma, então tudo aqui nos parece natural. Ao nos deparar com pessoas que entendem coisas de forma tão diferente, entendemos melhor o mundo e a nós mesmos. Olhar a nós mesmos de outra perspectiva é uma coisa muito poderosa e nos faz um tiquinho mais tolerantes.

E precisamos todos de mais tolerância para compreender a vida com mais do que só o nosso crivo de bom senso. É preciso que  outras pessoas nos mostrem que bom senso é relativo e viajar, tirando a gente da zona de conforto, faz justamente isso.

Viajando conhecemos pessoas com expectativas e costumes diferentes dos nossos, nos trazendo algumas lições:

· Tente se abrir ao diferente. Se os hábitos do país parecem estranhos a você é provavelmente porque o contexto que criou aqueles hábitos foi diferente do seu. As viagens mais interessantes não são necessariamente as mais confortáveis. Tente entender o contexto e enriqueça sua experiência. Conhecendo o diferente, você aprende mais sobre você.

· Leia um pouco sobre a história do lugar. Buscar informações sobre a história local antes de viajar já faz parte da viagem. Aquece os motores e te faz colocar as experiências que vai viver sob o prisma correto.

· Entenda os hábitos locais. Quando eu estive na China, tentei fazer uma reunião logo depois do almoço. Ao entrar na sala, me deparei com 6 pessoas dormindo com as cabeças deitadinhas na mesa. Se o costume é a siesta, abrace e não se programe para muitas atividades logo após o almoço.

· Busque os produtos locais. Entendendo porque as lojinhas locais vendem aquele souvenir, de onde ele vem e como se encaixa na cultura e história do local é uma excelente forma de entender aonde você se encontra e valorizar a comunidade. Dê uma volta pelas lojinhas de bairro e pergunte. Sempre haverá alguém feliz de saber que você esta verdadeiramente interessado na cultura deles.

😉

Tipicamente americano!

 

 

Por Tatiana Carvalho 😉

Tati Carvalho
Tati Carvalho
TATI CARVALHO É PUBLICITÁRIA. TRABALHA ENTENDENDO AS PESSOAS E CONSTRUINDO MARCAS HÁ MAIS DE 15 ANOS. ACREDITA QUE PODEMOS NOS TORNAR PESSOAS MELHORES A CADA NOVO PONTO DE VISTA QUE OUVIMOS, A CADA NOVA REALIDADE QUE CONHECEMOS E VIAJA PRA ISSO. DIVIDE, AQUI NO BLOG, UM POUQUINHO DESSAS EXPERIÊNCIAS ÚNICAS.

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